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domingo, 21 de maio de 2017

O Poeta e a Filosofa em: A Filosofia do Desejo e do Prazer / Fábio de Carvalho Maranhão

XXIII

Crônica Meio-Conto [+16]

Tendo eu lido muito Filosofia, História e Literatura, temo a perpétua consolidação de algumas práticas que boa parte da humanidade acentua através das ações ditas, para muitos, normais. Não tenho interesse em rebuscar o objetivo principal dessa prosa nem tão pouco utilizar metáforas para dizer o que pretendo através de sentidos mais amplos. Ao que me refiro, creia que poucas pessoas no mundo pensam ou ao menos se preocupam. Tenho falado por aí sobre o dinheiro e a vergonha. O dinheiro no sentido da ganância da humanidade, e a vergonha do ponto de vista de renderem-se ao primeiro.

Outro dia, escrevendo um diálogo pervertido, percebi que os personagens ampliaram tanto os conceitos e acepções acerca do que e para que serve o dinheiro e a vergonha, que concluí, que da maneira que as coisas andam evoluídas, muito do que eles falaram faz sentido. Não houve bate-boca nem desentendimento, e sim, um diálogo amistoso entre um poeta apaixonado por álcool, noite e mulheres libertinas ao extremo e uma filosofa e escritora de contos adultos, versada sempre em Baudelaire e embasada em Henry Miller, cuja característica mais marcante, era sua forma de falar olhando nos olhos como se o poeta fosse um prato de comida fresca surgido na sua frente após três dias de jejum. Para ser mais direto, ela era apaixonada por sexo, não largava "As Flores do Mal" por nada, e nas horas vagas criava personagens para seus contos baseados nas suas observações dos comportamentos que observava no dia a dia. O poeta, discreto e direto, também lhe comia com os olhos e com as mãos quando chegava em casa, pois ao menos uma vez por semana, dialogavam sobre tudo, e entre um encontro e outro, regado a Wisk, Vinho e não raramente Vodka, muitas coisas eram escritas e registradas, já que havia um propósito central naquelas ocasiões: Além de ambos desejarem "comerem-se", pretendiam escrever cada qual um livro, onde o poeta escreveria de forma filosófica sobre o comportamento humano e a falta de identidade com questões morais e de conteúdo intelectual que assola grande parte da humanidade. A filosofa por sua vez, faria a mesma coisa, mas com uma composição pautada na análise poética, já que a filosofia nasceu, para dentre muitos objetivos, para compreender a poesia. Pois bem, um livro filosófico baseado em pontos de vista de um poeta e um livro poético fundamentado em análises de uma filosofa. 

Não tenho interesse de narrar aqui longos trechos dos diálogos dos dois representantes da luxúria intelectual e da intelectualidade na sua essência. Mas não posso deixar de descrever esta passagem, que para mim, nem o Dr. Zuan Açoeiro proferiria com tamanha exaltação aos prazeres da carne e do intelecto. 

Numa noite de sábado, quando o poeta Teodoro Clark e a filosofa Doroteia Norá se travaram com uma garrafa de Wisk em um lugar que não posso revelar. Não é que não posso, é que não devo, pois não me é permitido revelar esconderijos secretos que servem de refúgio para intelectuais a serviço da produção do conhecimento.

___ "A primeira dose é do santo", exclamou Teodoro quase derrubando a primeira porção cawboy retirada de um escocês 12 anos.

De pronto, Doroteia exclama:

___ Alto lá!

O silêncio reinou no esconderijo dos inteligentes.

___ O que há Doroteia?
___ Mostre-me um santo. Se me mostrar primeiro, poderá oferecer-lhe esta dose. Caso contrario, não vai desperdiçar esse líquido precioso com uma asneira dessas.
___ De fato, não terei como apresentar-lhe um santo. Neste caso, vamos dividi-la e imaginarmos que podemos pensar que deus somos nós...
___ A ideia é ótima. Ademais, não são todos os dias que temos em nossa frente um troféu desses. 

Doroteia, como sempre, já o mirava profundo nos olhos, como se a fome de uma eternidade lhe pousasse o desejo de saciar sua fome de uma existência em um momento breve...

___ O que tem nesses olhos, Doroteia?
___ Tudo e ao mesmo tempo, nada.
___ Eu posso escolher acreditar nas duas opções?
___ Poeta não precisa pedir.
___ E filosofa não precisa metaforizar discursos, pois sendo eu poeta, sei muito bem ler olhos, palavras e almas...
___ Grande filosofia a sua. Mas diga-me uma coisa, Teodoro: O que hoje é preferível para humanidade é o dinheiro ou a vergonha?
___ O dinheiro.
___ Justifica!
___ Quem tem dinheiro pode comprar até o silêncio das pessoas imorais. Não adianta você pensar que vergonha vale muita coisa hoje. Um exemplo muito bom é observar que basta uma pessoa rica cometer um ato absurdo que logo cai no esquecimento, pois se abrir o bolso, compra imprensa televisiva, jornais impressos, programas de rádio que promovem notícias e por aí vai. Uma pessoa desprovida do vil metal terá que conviver pela vida toda com algum deslize que cometer, mesmo que seja apenas no bairro ou na cidade em que reside.
___ Tua observação é coerente. Mas fale-me uma coisa: O desejo é para ser matado ou contido?
___ Matado, certamente. Mas qual tipo de desejo você se refere?
___ A todos! Especialmente o desejo carnal.
___ Este é o mais valioso, pois transforma, do corpo à alma. O paraíso na terra é um gozo bem dado. Um beijo sufocante. Um momento de êxtase olho à olho com uma pessoa que faz sua alma entrar na dela com apenas um olhar. Eu tenho refletido sobre essas questões, mas preciso colocar muitas coisas em prática ainda.
___ Você aguça minha imaginação com tantos detalhes, poeta!
___ E suas indagações, filosofa, fazem-me dizer coisas que antes não havia nem imaginado. 
___ É a bagagem que o amigo carrega. 
___ Bondade sua. A amiga é que carrega em si, a potência da filosofia, capaz de decifrar até o estado psicológico do poeta e virar pelo avesso uma poesia que se componha.
___ Eu apenas falo o que penso.
___ Por que não faz o que deseja também?
___ Como assim?
___ A teoria serve para muitas coisas, mas apenas a prática serve de complemento à vida. É preciso viver a vida, Doroteia. 
___ Certamente! Mesmo porque teoria não é ação.
___ Veja só, irei mais profundo em uma observação. Não se espante...
___ Eu? (risos)
___ É que vou aprofundar os exemplos.
___ Adoro situações profundas, Teodoro. Fique a vontade. Fale.
___ O que é o sexo, para você?
___ É a razão de nós estarmos aqui. Mas falo no seguinte sentido: Sem ter havido sexo, nós não estaríamos aqui neste momento dialogando.
___ Sim! Mas há algo de mais extravagante no sentido do prazer do que o sexo?
___ Claro que não!
___ Para muita gente, falar sobre sexo é o fim do mundo, mas para ler, assistir ou ouvir, são compulsivos. Na calada das noites, manhãs, tardes e madrugadas, imaginam "absurdos deliciosos" e desejam o "indesejável". São escravos de si! Sofredores eternos. Creia que se deve viver a vida, minha amiga, e o sexo, da forma que descrevi anteriormente, é o paraíso terrestre, o alimento da mente, do corpo e da alma...
___ Estar vendo porque falo que você aguça minha imaginação? Passa-me a garrafa, por favor, poeta.

Quando Teodoro lhe foi entregar a garrafa com a mão direita, Doroteia Norá lhe toma com a outra mão e puxando-lhe pelo colarinho, e mirando-lhe profundamente nos olhos, como se quisesse ler sua alma, filosofa com acentuadas metáforas:

___ Para que servirá a água em meio a um incêndio se não houver mãos para conduzir o líquido ao lugar adequado?

Teodoro, ao tentar falar, é surpreendido:

___ Cale a boca, que ainda não terminei. Olhe nos meus olhos e veja esse fogo em chamas! Ver? É o reflexo da tua alma em chamas. De que adiantará nossas bocas, nossas mãos, nossos corpos em um momento de fome, se não os utilizarmos para matar essa fome que inquieta nossa alma? Sabes para que serve uma boca, poeta? Para levar uma pessoa ao paraíso ou para o inferno. Depende do ponto de vista. Os olhos fazem a mesma coisa. Olhos e olhares são combustíveis do prazer, são a marcha primeira da ação, são dois elementos capazes de nos fazer enxergar o que o pensamento do outro deseja nesse momento.
___ Estais me deixando reflexivo.
___ Imaginando algo?
___ Sim!
___ Por que não faz o que imagina? Seria bom começar, senão vais ter o que merece. E olha que quando estou como estou eu não poupo minhas mãos. Gosto de usá-las para castigar quem merece...

O diálogo entre o poeta e a filosofa continuou com uma troca de olhares tão profunda, que perto do raiar do dia, não havia mais garrafa de Wisk nem anotações teóricas realizadas. Roupas pelo chão e suores derramados compuseram o cenário dos primeiros trinta minutos. Ninguém ouvia uivos da loba nem seus gemidos estridentes, capazes de acender uma fogueira a quilômetros. Naquela noite, a filosofia do desejo e do prazer reinou. O poeta foi tomado por um surto de prazer comandado por aquela que vertia só no olhar, a selvageria do prazer, capaz de fazer de um simples momento, um êxtase de eternidade. Esqueceram-se do diálogo inicial e fartaram-se entre ambos no esconderijo secreto, com um diálogo secreto, com a mais secreta forma de sentir o gosto da vida, que muitos negam ser através do sexo entre um homem e uma mulher...

Fábio de Carvalho [Maranhão]
21/05/2017 - 10h57min - 12h01min - Domingo, Cortês-Pernambuco.
Escritório de Trabalho [Biblioteca Particular]



Imagem com Edição de Arte. Acervo Arte Visual.

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